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Lawtech: o que é e como está o mercado para elas?

Lawtech: o que é e como está o mercado para essas startups?
As lawtechs chegaram para ficar e elas já estão revolucionando o Direito no Brasil e no mundo


O que é uma LawTech?

LawTech é o termo utilizado para denominar startups jurídicas que oferecem novas ideias, em forma de produto ou serviço, que buscam aprimorar e resolver os principais problemas do universo jurídico.

O termo, derivado das palavras law e technology, parte da premissa de utilizar a tecnologia para facilitar a rotina jurídica e oferecer soluções tecnológicas que garantam otimização do tempo de uma advocacia ou departamento jurídico de empresas. As startups do ramo exploram e identificam as deficiências do meio jurídico ou até mesmo de simples atividades diárias a fim de proporcionar uma rotina mais eficiente e produtiva.

LawTech e LegalTech: Existe diferença?

No exterior, o termo LegalTech é utilizado para denominar soluções ou startups que prestam algum serviço para o próprio mercado jurídico: advogados, advocacias e departamentos jurídicos de empresas. Já as LawsTechs, são famosas por desenvolverem soluções para o público final dos advogados.

No entanto, essa diferença parece não existir aqui no Brasil. De acordo com Bruno Feigelson, do ponto de vista prático LawTech e LegalTech são iguais. Ambas utilizam uma base tecnológica para suprir demandas do setor jurídico e transformá-lo positivamente. “Nos Estados Unidos, por exemplo, se usa mais LegalTech. Mas aqui no Brasil optamos por usar LawTech e eu, particularmente, sou favorável porque acho o termo mais sexy”, diz.

Quais os impactos das LawTechs para o mercado jurídico?

Redução de custos

Todo mundo sabe que uma das vantagens de grandes corporações trabalharem com startups é a possibilidade de economia de custos. Isso não é diferente com o setor jurídico – só no Brasil, as empresas gastam, em média, 2% de seu faturamento com litígios.

A startup inglesa, DoNotPay, desenvolveu uma espécie de advogado gratuito que combina chatbot com inteligência artificial a fim de reduzir custos para o próprio cliente. O robô-advogado já venceu mais de mil contestações de multas de trânsito no Reino Unido e em Nova York.

Mas não é só para reduzir os custos dos clientes que as soluções de LawTech são desenvolvidas – a implantação de novas tecnologia também irá diminuir os custos de transação dentro das próprias empresas. “A economia que a Localiza teve ao implementar tecnologia no setor jurídico foi na casa de dezenas de milhões de reais”, afirmou Christiano Xavier, responsável pela área jurídica da empresa na época e co-fundador da Future Law.

Aumento de produtividade e eficiência

Independentemente da área da LawTech, o ganho em eficiência e o aumento da produtividade são fatores que chamam atenção dos escritórios e departamentos jurídicos. Essas soluções transformam o dia a dia da prática jurídica e permitem que os advogados aloquem seu tempo em atividades mais sofisticadas e que necessitem de maior carga intelectual.

A solução de automação de documentos da Linte, por exemplo, permite a redução no tempo de redação de petições e contratos, enquanto sua solução de gestão de processos e contratos facilita o acompanhamento de e consulta de processos. De acordo Christiano Xavier, foi com soluções de automações desse tipo que a Localiza, em parceria com a NetLex, conseguiu reduzir 22% no número de processos globais.

Democratização dos serviços e transparência

As startups voltadas para soluções jurídicas podem trazer melhorias tanto na otimização do tempo no exercício da advocacia quanto no acesso a justiça com menos burocracia. “A tecnologia é um grande agente na democratização dos serviços jurídicos e busca torná-los acessíveis para todos. É mais um ganho social, porque quanto mais advogados forem estruturados em plataformas online, por exemplo, mais a sociedade pode ganhar”, defende Antônio Maia, founder da Tikal Tech.

Além disso, de acordo com Bruno Feigelson, a tecnologia permite que você dê mais transparência para as informações e ao próprio negócio de maneira mais organizada. “Eu só enxergo vantagens em usar tecnologia no setor jurídico, ela dá mais transparência e entrega um valor imenso para a sociedade”, diz o Presidente da AB2L.

Desafoga o judiciário e diminui o litígio

Atualmente, a Justiça sofre com as altas demandas, com o engessamento em relação ao tempo de trâmite de processos e com a impossibilidade de aumentar o número de funcionários. De acordo com a advogada Clarissa Luz, confundadora do coletivo Nós8 e do ELASinTech, a inteligência artificial pode funcionar como uma grande aliada na redução do número de processos ao julgar demandas repetitivas em blocos ou elaborar sentenças com informações similares.

Com a ajuda da tecnologia, apareceram outras formas de resolver milhões de processos judiciais: as plataformas de resolução de conflitos online. Com o intuito de diminuir a quantidade de processos e dar uma velocidade maior a eles, segundo Leonardo Toco, COO da AB2L, a Justiça está apostando nessas plataformas online para fazer mediações ou até mesmo acordos.

De acordo com Bruno Feigelson, o surgimento dessas iniciativas revelam uma mudança de mindset do setor jurídico. “Na Índia, o judiciário tem 20 milhões de ações para mais de 1 bilhão de pessoas e nós, aqui no Brasil, temos 100 milhões para 200 milhões de pessoas. Mas com essas inovações, a gente começa a perceber que o próprio advogado quer litigar menos e fazer mais acordos”, conta.

Pesquisa jurídica e maior acesso à lei

A tecnologia ajuda, e muito, na tarefa demorada da pesquisa legal. “Antigamente, a busca de documentos era feita por diversos advogados que analisavam documento por documento. Mas hoje, nós já vimos muitas soluções de inteligência artificial que ajudam a encontrar um único documento que pode fazer a diferença em uma ação”, conta Bruno Feigelson.

Um exemplo é o ELI, sigla para Enhanced Legal Inteligence (Inteligência Legal Melhorada), que consegue identificar e organizar processos, buscar jurisprudência e até mesmo sugerir os próximos passos da ação para o advogado. Uma das suas funções, chamada de ELI ICMS Energia, é focado na automação de restituição do ICMS em contas de energia elétrica.

De acordo com Antonio Maia, fundador da Tikal Tech, desde a coleta de informação e cálculo da restituição até a petição inicial, há uma economia de cerca de 1000 toques entre digitação no teclado e cliques com o mouse. “O advogado demoraria cerca de 30 horas para fazer a petição inicial, mas o ELI faz, sem nenhum erro, em 4 minutos”, diz.

LawTech no mundo

O setor de LawTech ainda está dando os primeiros passos, mas a indústria construiu uma série de categorias emergentes nos últimos anos. De acordo com a CB Insights, as startups de tecnologia jurídica arrecadam apenas US$ 739 milhões em fundos agregados de 2011 a 2016.

Apesar do baixo investimento mundial, segundo uma análise da Thomson Reuters, houve um aumento de 484% no número de patentes arquivadas de tecnologia jurídica nos últimos cinco anos. Apenas em 2016, 579 patentes relacionadas a novas tecnologias de serviços jurídicos foram arquivadas em todo o mundo – ante 99 em 2012, de acordo com dados da Organização Mundial da Propriedade Intelectual.

Os números refletem o aumento de serviços jurídicos alternativos – como escritórios de advocacia virtuais – e a rápida expansão do setor jurídico online. Essa tendência é, em grande parte, impulsionada por empresas e indivíduos que buscam além dos canais tradicionais de assessoria jurídica.

A análise da Thomson Reuters ainda indica um aumento no uso da tecnologia e terceirização por escritórios tradicionais de advocacia no Reino Unido, nos EUA e no Leste Asiático. De acordo com a pesquisa, as patentes arquivadas nos EUA representaram a maior proporção do total (38%), seguido de China (34%) e Coreia do Sul (15%).

"Os escritórios de advocacia tradicionais estão enfrentando uma maior concorrência, muitos estão adotando tecnologia de ponta para agilizar processos e reduzir custos operacionais, ou estão terceirizando para um provedor externo", diz Charlotte Rushton, Diretora Geral de Grandes e Médios Escritórios de Advocacia da Thomson Reuters.

Como está o mercado de LawTech no Brasil?

De fato, as LawTechs têm revolucionado a prestação de serviços jurídicos no mundo inteiro. Apesar de ocorrerem em menor escala no Brasil, essas novas práticas já estão trazendo enormes ganhos de eficiência. Segundo Christiano Xavier, há uma explicação para isso: o ano passado serviu para descobrir as LawTechs no país e 2018 será o ano em que as empresas vão realmente começar a adotá-las.

No Brasil, a tecnologia está, aos poucos, ganhando corpo no mercado jurídico. De acordo com a Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs, já são mais de 100 startups jurídicas no país. Essa gama de soluções facilita a rotina de qualquer advogado e aumenta a produtividade consideravelmente.

De acordo com Clarissa Luz, o Brasil ainda está muito incipiente quando o assunto é tecnologia ou startups. “O Brasil realmente não tem tantas soluções como lá fora. Nos Estados Unidos, advogados de grandes escritórios, mesmo tradicionais, já utilizam inteligência artificial em perícias judiciais, uma coisa que eu nunca vi no Brasil”, diz Clarissa.

Outro ponto levantado por Christiano Xavier é em relação aos investimentos em LawTechs, uma vez que  o Brasil ainda está atrasado em relação ao resto do mundo. Mas ele garante que isso é questão de tempo: “Se tem um lugar onde as LawTechs vão dar certo no mundo, é aqui no Brasil”.

Conheça as categorias das LawTechs no Brasil:

Analytics e Jurimetria – As startups dessa categoria, geralmente, são plataformas de análise e compilação de dados e jurimetria. De acordo com Bruno Feigelson, essa área ajuda as empresas e escritórios jurídicos a prever as decisões judiciais.

Automação e Gestão de Documentos – O jurídico brasileiro tem muita informação, contratos e petições. Pensando automatizar esses processos, softwares de automação de documentos jurídicos e gestão do ciclo de vida de contratos e processos estão surgindo para economizar tempo e gerar eficiência.

Conteúdo Jurídico, Educação e Consultoria – Em geral, se enquadram portais de informação, legislação, notícias e até empresas de consultoria com serviços desde segurança de informação a assessoria tributária.

Extração e monitoramento de dados públicos – Nessa categoria, encontramos softwares de monitoramento e gestão de informações públicas como publicações, andamentos processuais, legislação e documentos cartorários.

Gestão – Escritórios e Departamentos Jurídicos – Soluções de gestão de informações para escritórios e departamentos jurídicos.

AI – Setor Público – Soluções de Inteligência Artificial para tribunais e poder público.

Redes de Profissionais – Nessa categoria, se encaixam redes de conexão entre profissionais do direito, que permitem a pessoas e empresas encontrarem advogados em todo o Brasil.

Resolução de conflitos online – Startups dedicadas à resolução online de conflitos por formas alternativas ao processo judicial como mediação, arbitragem e negociação de acordos.

O Brasil é um mercado fértil para as LawTechs

O país é um campo fértil para o desenvolvimento de tecnologia jurídica – atualmente, cerca de 80 milhões de processos estão em tramitação na justiça brasileira e mais de 1 milhão de advogados foram contabilizados pela Ordem dos Advogados do Brasil em novembro de 2016.

O Brasil é o terceiro país do mundo com mais advogados em números absolutos. Nos Estados Unidos, há cerca de 1,3 milhões de advogados e, na Índia, o número de operadores do Direito sobe para 2 milhões – embora a ordem dos advogados do país estime que 30% não atue na área.

Devido ao alto número de advogados registrados na OAB, o Brasil está entre os países com maior densidade de advogados em relação à sua população. O país, que contabiliza um profissional jurídico a cada 209 habitantes, só perde para o Reino Unido, onde a proporção é um advogado a cada 354 pessoas, e para os Estados Unidos, um a cada 246.

Além disso, segundo o Ministério da Educação divulgou, um em cada dez universitários no país está assistindo a uma aula de Direito. No total, são 853.211 estudantes distribuídos em 1174 cursos de graduação na área. Nos Estados Unidos, apenas 280 faculdades oferecem cursos de Direito e, no Reino Unido, o número cai para 95.

De acordo com Clarissa Luz, outro fator contribui para o Brasil ser um mercado potencial de LawTechs: a crise. “O país passa por uma crise que se arrasta há algum tempo e para a inovação isso é bom. No meio de um momento como esse sempre há um terreno fértil para o empreendedorismo. Embora incipiente, o mercado jurídico brasileiro ainda tem muita coisa a se explorar”, defende.
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